quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

Como se chama trailler de livro?

"Saí para além de toda a rua e meu bairro é à beira-mar, possui palmeiras muitas que cortam todas as vias, e altas que encostam o nível do cimo dos prédios residenciais. O cheiro de maresia é nauseante, mas continuei caminhando entre condomínios gradeados e árvores imperiais, na tentativa burra de encontrar a resposta para a minha dúvida. Quando cheguei ao final de uma alameda bastante sombreada e fresca, já era possível avistar jovens surfistas indo cair n’água melecados de protetor solar, criancinhas zombando de suas babás, correndo bobas em ziguezague atrás de bolas de plástico e, ao fundo, as obras do emissário submarino, que meio século depois ainda não havia terminado. O sol cambiava para o centro do céu sem obstáculos à sua luz divina, mas não era verão. Em minha cidade, verão é período de chuvas, mas pouca gente repara nisso, pois é mais fácil aceitar a dúbia realidade de que a estação é quente todo o tempo, de dezembro a março. Bem quis me deitar na areia, mas minha pele já vai muito mal tratada de tanto descamar ao longo dos anos. Criei constelações de pintinhas marrons ao redor do pescoço e das costas, como tem a minha mãe, e me envergonho delas. Meu ex-marido adorava enxergar desenhos conhecidos unindo pontos do meu colo, e via elefantes, flores, violões, até cubos inteirinhos por passar horas a cruzar o indicador na minha pele como se fosse uma caneta mágica. Agora eu morava só, nenhum vizinho amigo, nenhum namorado, e um filho morando nos Estados Unidos que ligava de três em três meses para avisar: mãe, tá ouvindo?, é pra dizer que está tudo bem, mês que vem tô aí, beijo. Quase não recebo ligações. Muitos amigos que tive foram se esvaecendo até sumirem por completo. Aquilo ficou na minha cabeça: “sei onde ele está.”, a voz rouca, meu coração acelerado, a garganta cingida, pois ninguém iria passar um trote a uma mulher de meia idade sem nada a perder. Em vez de dizer aquilo, o informante poderia ter dito: me encontre onze horas no motel tal para pagar um resgate, e sem problemas eu iria. Mas andar pelo bairro, ver os surfistas, as criancinhas e as obras do emissário não elucidaram a minha questão. A noite de sábado abria suas primeiras luzes de festa e a brisa da orla trocava de mão. Voltei para casa. E bizarro, havia mensagens e mais mensagens arquivadas na caixa postal telefônica. Oi, aqui é a companhia dos cartões, a senhora poderia retornar a ligação para negociarmos a dívida? Boa noite, sou eu, amanhã posso passar aí pra pegar o que restou das minhas coisas? Ei, atenda, é importante, sou eu, Beatriz; liguei pra você mais cedo e caiu. Mãe, tá ouvindo?, é pra dizer que está tudo bem, mês que vem tô aí, beijo."

(Trecho de "A Pedra do Mangue")

5 comentários:

Gabriela Ferraz disse...

Gostei do trecho, obrigada pelo comentário!! Uma surpresa boa ver que vc usou um pouquinho do seu tempo lendo meus textos :) e ah, quanto ao rosa, eu gosto poxa!! rs. Parabéns pelo seu blog, agora sou uma seguidora daqui :) beijos

Guto Pina disse...

Muito bom. Nunca lí esse. De quem é?
O Budapeste parece ter ficado ótimo. Quero que estreie logo.
Forte abraço

????????????????? disse...

Meu caro, depois de ler teu blog, indiquei o mesmo para receber um selo.
Abraços.

Guto Pina disse...

Prezado,

Por onde andas?

Aquele abraço

Guto Pina disse...

Um cara que está aprendendo a gostar de Los Hermanos!